segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O suicídio de uma puta

Um samba tocando no rádio,
um livro na mesa...
Sérgio Sampaio
rasgando a tristeza.

na banda o poeta tocava flauta
em suas próprias vértebras

na dança - que balança o balaço -
uma puta em seu regaço.

Ele deixou o livro
Ela ao menos sabe ler,
nem brincar...
Apenas botar pra gemer.
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A FLAUTA VÉRTEBRA

A todos vocês,
que eu amei e que eu amo,
ícones guardados num coração-caverna,
como quem num banquete ergue a taça e celebra,
repleto de versos levanto meu crânio.

Penso, mais de uma vez:
seria melhor talvez
pôr-me o ponto final de um balaço.
Em todo caso
eu
hoje vou dar meu concerto de adeus.

Memória!
Convoca aos salões do cérebro
um renque inumerável de amadas.
Verte o riso de pupila em pupila,
veste a noite de núpcias passadas.
De corpo a corpo verta a alegria.
esta noite ficará na História.
Hoje executarei meus versos
na flauta de minhas próprias vértebras.
(Maiakovski)

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Clara

Meu corpo de bruta pedra enleia o teu
de ebúrnea textura.
És assim: inerte, Clara e pura
Como o amor enteu*.

Minha mão que se perde na tua pele
E escorrega e desliza, como no gelo dança
a água, que derrete e impele
o gelo para uma epopeica andança.

Entrelaçam as almas dos amados,
assim como os pés. Os corpos nus abraçados
e os espíritos em torpor
sentem o vento soprar a ventura.

Consolidam – debaixo da manta de lã -
os versos de Rimbaud:
“No verão às quatro da manhã
O sono do amor ainda dura”.




*inspirado por Deus

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

canção de outono

Longos soluços
dos violões
d'um outono
Ferem meu peito
num langor feito
calma e sono.

Me sufocando
pálido, quando
soa a hora
me vem à mente
tempo vivente.
A alma chora.

Violento,
vou como vento.
Me Transporta
pra cá, pra lá
feito assim vá
Folha morta.

(Paul Verlaine, minha tradução)

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O Tempo e o ônibus

O infinito em um ônibus. Você sabendo diferenciar tempo de espaço. O ônibus se deslocando em seu tempo físico indissociável do espaço, mas eu deslocando o mesmo espaço em meu tempo; outro tempo. E ela também, com seus dedos balançando como pequenas garras, mas que não querem pegar a presa, apenas senti-la de leve. Fingia tocar-me casualmente.

E mil vezes meus olhos...passavam sobre o mesmo verso de Bukowski. E minha mente nos leves toques.

Ela mudou de posição e fingiu que dormia, reclinou-se sobre a cadeira, apoiando seu pé no corrimão da escada.

E os buracos feitos por deus na terra, que se transformavam no balanço do ônibus. Nossas pernas se encontravam, rapidamente, e logo se separavam, como a mão dela quando tocou meu braço. Num inocente e delirante desejo nos tocávamos e nos repelíamos, como que se desculpando com as pernas.

E como a hipnose do canto das sereias, nos rechaçávamos cada vez menos, e mais tempo nos encostávamos fingindo não perceber, nem sentir a carne do outro, mas sabendo que não estávamos enganando... nem a criança que olha para nós, sem conseguir desviar o olhar e sendo a única a compreender o que se passa ali.

Estava LOUCO! Era meu psicológico, criando histórias. Era delírio! Mas era bom; era infinito, mesmo compreendendo sua efemeridade.
Menos de 40 minutos de eternidade. Meu ponto chegando e eu pensando: se era mesmo real?

E se fosse? O que significaria aquele tempo? Aquele espaço?Um simples ponto material
na Via-láctea.

O orgasmo de uma mosca, ao sugar o sangue de um viciado em heroína.

Ela descendo no mesmo ponto que eu, com a mão se equilibrando sobre o corrimão. Eis a mão, a mesma do início.

Tinha que tocá-la. Sua mão. Minha mão sobre a dela, no corrimão, sem querer. E pronto iríamos embora, ela para baixo e eu atravessando a rua. Mas não toquei, e segurei o corrimão acima de sua mão.

Desci. Ela seguiu para baixo e eu atravessando a rua. Eu a olhando , mas ela continuou caminhando, durante quatro segundos com o olhar para frente, e finalmente para o bem de minha alma, se virou e me encarou. Não era delírio.

domingo, 15 de novembro de 2009

Alex não gosta de fotos

Seu nome poderia ser Severino,
Lázaro, ou qualquer nome Bíblico
Mas não.
Seu nome era Alex.

Era Alex quem pedia cigarro
nas mesas de boteco
e bêbado abria-se a qualquer um.

Contava sobre sua vida
e soprava – para nós –
com a fumaça do cigarro
suas mortes.

E em sua existência se equilibrava
tanta vida e tanta morte

Vestido em um corpo enrugado
Pelo fogo,
numa tentativa de transformar
suas cinzas em espírito.

Mas o fogo que lhe queimava
vinha do Inferno
e não o derretia.

E por não encontrar Deus
mais em Deus acreditava.

Ele que poderia se perder

Se perdeu.

Mas o amor existe
No gênero humano.

E Alex mais do que qualquer um
sabe o que é ser humano.
Achando em seu Senhor e sua Senhora
o que nenhum poeta soube falar.

Ainda assim sua existência se equilibra
em tanta vida e tanta morte.

Morre em solidão.
Vive em sua carne rasgada.
Morre no ensurdecedor silêncio
do mundo.

E vive – acima de tudo –
porque ama.

Alex não é ator,
nem artista.
Se acha feio
Não gosta de fotografias

Pois conhece a realidade
na epiderme e na alma.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009


A manhã se mostra em ramalhete
de doces ervas do bosque.
Talvez bucólico

À tarde, ramalhavam as folhas
do livro
certeza, Bukowski

18:20
e o devaneio ficou pela manhã...
Tumbleweeds rolam no deserto da tarde]

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Verve

Se a caneta é a faca do poeta
que corta a carne
Minha poesia já foi feita:

minha poesia escrita na pele
a óleo quente