terça-feira, 27 de outubro de 2009

As Percepções do Subsolo

Estou reescrevendo; reeditando um ensaio no qual tento comparar - não sei se forçosamente – dois livros de conteúdos totalmente diferentes, mas que em certo ponto se convergem. Os livros são: Memórias do Subsolo de Dostoiévski e As Portas da Percepção de Aldous Huxley.

O que tento comparar é a relação social dos dois, ou melhor dizendo, a ausência dela. Mesmo que o homem do subsolo seja por natureza um ser isolado; misantrópico e no relato pessoal de Aldous Huxley torna-se difícil e desinteressante o convívio pessoal por causa do efeito da mescalina, droga originária do peiote - com principio ativo parecido com o lsd - mas que para o autor não causa alucinação; visões e sim uma maior percepção dos sentidos e por isso o convívio pessoal se torna tão insatisfatório.

Se em um livro o personagem é por essência isolado da sociedade e no outro é apenas momentâneo, e se um é fictício e o outro real não significa que tal comparação é inapropriada, pois se sabe que o monólogo de memórias do subsolo é influenciado na vida do próprio autor, quando foi preso e condenado à morte, mas que foi absolvido nos momentos finais, tal fato marcou profundamente a vida e obra de Dostoiévski.

Os dois protagonistas têm, sem dúvida, uma inteligência e percepção do mundo acima da média, muito além da mediocridade, outro ponto em comum. E talvez seja essa percepção mais aguçada que os façam, de certo modo, criticar os homens de ação; a vida cotidiana. Seria o mesmo que Baudelaire critica em Paraísos artificiais no Poema do Haxixe: que uma sociedade não sustentaria se todos usassem haxixe, pois o desinteresse pelos compromissos seria grande e que haveria a vontade apenas de reflexão e não de ação.

Em "Portas da percepção" Huxley diz que a mescalina traz aos homens comuns as percepções dos músicos, poetas e pintores, mas que o grande problema é conciliar a contemplação com as relações humanas.

"A mescalina nos abre acesso a Maria, mas fecha a porta que nos leva a Marta (Nas alegorias cristãs, Marta simboliza a vida ativa, enquanto Maria a contemplativa)” - Aldous Huxley.

O que é mostrado no livro do autor inglês é que esses sentidos mais aguçados são desnecessários para a vida cotidiana, chegando a nos atrapalhar no dia a dia, e que nosso organismo faz com tenhamos o mínimo necessário de percepção. A mescalina simplesmente age sobre esse mecanismo que inibe nossos sentidos, liberando-os.

“E, entretanto, minha pergunta continuava sem resposta. Como conciliar essa percepção aguçada com uma justa preocupação pelas relações humanas, com os deveres e as tarefas inadiáveis, para não mencionar a caridade e a piedade atuante? A velha disputa entre contemplativos e ativos estava sendo renovada”, Aldous Huxley.

"Uma consciência clarividente demais, asseguro-vos, senhores, é uma doença, uma doença muito real. Uma consciência ordinária nos basta mais que amplamente em nossa vida cotidiana, isto é, uma porção igual à metade, a um quarto da consciência outorgada ao homem culto do século XIX e que, para sua desgraça, habita Petersburgo, a cidade mais abstrata e” premeditada “das cidades que existem sobre a Terra...”, Dostoiévski

terça-feira, 20 de outubro de 2009

O sarcasmo está na moda.

Por que há tantos blogs por ai? E a maioria buscando sempre um estilo irônico-sarcástico, que acaba caindo no ridículo, tentando parecer engraçados e ao mesmo tempo ácidos.

Pode ser que esse texto também acabe virando-se contra si mesmo e torne um texto dos quais eu critico no momento, não estou à parte dos erros e nem me sinto melhor escritor do que qualquer blogueiro.

Estou aqui escrevendo o que qualquer outro blogueiro escreveria ou já escreveu, talvez seja pingar no molhado ou qualquer outro tipo de dito popular que se encontra estilosamente escrito nos blogs afora.

Mas pulando toda essa introdução na qual tento me livrar - em vão - da responsabilidade do que escrevo, falarei do que mais me incomoda nesses diários modernos.

O que mais me irrita, principalmente, é a busca forçada de um estilo para auto-afirmação: um palavrão escrito em letras maiúsculas para dizer que você está pouco se fodendo para os outros; uma palavra propositalmente riscada pra fingir um ato-falho e mostrar o quanto você é irônico; uma história de sexo, drogas e bebedeiras para exibir que sua intelectualidade está além dos clássicos e que prefere Bukowski, Jack Kerouac e mais alguns da literatura marginal.

Não estou criticando quem utiliza palavrões, ironias ou que lê toda a geração beat, mas aqueles que escrevem e fica nítido o quanto forçaram ao escrever aquilo e soou falso. Como diria Graciliano Ramos: “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer.”

E não tem como dizer aquilo que não se sabe, a ficção não é uma mentira - talvez seja esse o grande erro da maioria - a ficção serve como uma lente da realidade, é a forma metafórica de escrever sobre o que se vê e se sente; é a representação sintética do mundo.

Outro grande defeito de alguns blogueiros é achar que nasceram com o dom da escrita, que a arte de escrever é inerente a eles e que livros literários são grandes bobagens para pseudo-intelectuais. Não se aprende a escrever apenas sabendo gramática e palavras, isso é o de menos, a gramática é quase que o sistema opressor que não deixa que o texto vire uma anarquia e ninguém entenda nada.

Na verdade, acho que fui severo demais com a gramática, ela tem sim sua importância, mas secundária; coadjuvante, seria como o baixo em uma música, ele está lá fazendo o fundo, bem baixinho, mas se tirá-lo da música estraga tudo. Não, não sei, acho que a gramática é um pouco mais importante, The Doors não tinha baixo.

O que se pode tirar de tudo isso é que depois de House o sarcasmo virou moda.