sábado, 30 de janeiro de 2010

À Dança

Assim dançava teu espírito:
Rodando em uma oferenda aos deuses
gregos ou africanos;
doando-se à música.

Rasgando a terra
em passos bem marcados.

E o corpo dançando
sobre o eixo da vértebra
fazia tuas sandálias de tinta,
escrevendo com o corpo
tua poesia.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Poesia do Yage

Yage é uma viagem espaço-tempo.
O quarto parece sacudir e vibrar com movimento.
O Sangue e a essência de muitas raças:
negros, polinésios, mongóis da montanha
nômades do deserto, poliglotes do Oriente Próximo, índios,
novas raças ainda não determinadas
e por nascer e combinações ainda não descobertas
passam através do meu corpo.

Migrações, incríveis viagens através de desertos,
Florestas e montanhas
( Marasmo e morte em estreitos vales montanhosos
onde plantas brotam da pedra
e enormes crustáceos eclodem e quebram a concha do corpo),
através do Pacífico num catamarã
para a ilha da Páscoa.
A Cidade Composta onde todos potenciais humanos
estão espalhados num vasto e silencioso mercado.

Minaretes, palmeiras, montanhas, florestas.
Um lento rio onde pulam peixes defeituosos,
enormes parques tomados pelo mato
onde meninos deitam na grama...

(William Burroughs, no original em prosa no livro Cartas do Yage)

sábado, 23 de janeiro de 2010

Jacarezinho

As férias da infância
cravadas na solidão
do portão verde
da casa da minha avó.

Porão de metáforas
da nostalgia.
Garagem de sonhos.

Enquanto que a liberdade
não está presente
no álbum de família.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Seguirei a estrada

Seguirei a estrada
do vento que soprar mais rasgante.
Por hoje sou a débil criança.

E vou de trabalhos
em rotos lugares,
pisados.

Para, à noite, ouvir
- nas flautas fumegantes -
os acordes das estrofes
de meus versos.

Seguirei a estrada
por onde pesar meus ombros
e – cansado – deitarei sobre a grama
fazendo de verde meu repouso.

E entre os galhos de árvore
olvidar-me pelas estrelas.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Livros de Brinquedo

Meus livros estão improvisados
guardados em um armário de portas fechadas.
Tristes estão, por estarem se escondendo,
queriam mesmo é se exibir.

Se Baudelaire diz que a alma do vinho
prefere descer a goela do trabalhador
a ficar parada na adega,
Os livros preferem se espalhar
pelos quartos, salas e outros lugares
a ficarem em prateleiras se empoeirando.

E se começo a ler mais de um livro ao mesmo tempo
e me perco com isso
É porque quero que todos os livros se alegrem
de serem lidos e tirados da prateleira.

Sinceramente acho que os livros se parecem mais com brinquedos
do que com a alma do vinho.
Livros estão mais para Toy Story do que para Baudelaire.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Haiti

Caminha por entre os escombros.
Pisa sobre os cacos de vidro deixados no chão
pelo mundo.

Nem de longe vê a beleza,
Apenas um pássaro que voa torto
fugindo do fim.

Foi num dia como esse
Que Zeus mostrou sua forma divina
À Sêmele.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Tempo Oxidado

O tempo que oxida e corrói
Faz da madeira podre, do metal enferrujado.
A cicatriz da ferida que não dói,
ou faz sentir o membro amputado.

Nos põe rugas por toda parte
Desgasta tudo o que sopra a sua frente.
Desbota a cor do estandarte.

Mas é da antiga madeira
Que se faz a nostalgia da janela.
A cicatriz do passado no presente
cravada num pedaço de aroeira.