segunda-feira, 23 de abril de 2012

Sobre a loucura, a poesia, transgressão e modernidade

O ateísmo não pode nos tornar céticos, o artista não nega a vida. A racionalidade é muito mais louca e esquizofrênica. Pensar é enlouquecer, sentir é viver. Escravo do que sinto não me incomoda chorar vendo novela, ainda que eu nunca tenha assistido.

O que nos torna louco é a calma. O silêncio da noite escancara nossos medos. Mas Deus é esse vento que me sopra do nono andar, é o mais divino que eu posso encontrar por entre estrelas enquadradas em minha janela. Tento ser o mais sublime com meus olhos, vejo luzes de Bertoluci nos postes de Goiânia e a metafísica de se comer no pit-dog em frente a Igreja. Um dia bêbado quase morri com um pedaço de bacon na garganta. E sei que minha morte será patética como todas as mortes são patéticas, e ainda assim irão chorar quando morrer.

A arte a loucura e transgressão

O feio choca, mas não perdura. A arte é necessariamente bela, a arte de qualidade. Rimbaud diz sobre o feio, sobre o grotesco, mas sua escrita é muito bem trabalhada, é a artesania das palavras. Picasso desfigura o real, choca, mas ele nunca será um Salvador Dali. O próprio Salvador Dali no livro "Libelo contra arte Moderna" diz:

"1) Ele foi enganado pela feiura
2) Ele foi enganado pelo moderno.
3) Ele foi enganado pela técnica.
4) Ele foi enganado pelo abstrato"

A modernidade interpretou muito mal a frase de Rimbaud: "Uma noite, sentei a Beleza em meu colo. - E achei amarga. - Injuriei"
Não há necessidade de querermos ser modernos, isto bastou para Rimbaud. Nós somos modernos, querendo ou não. A linguagem em transformação, a língua sendo viva e evolutiva, não no sentido de qualidade, mas de estar sempre em transformação já dá ao poeta toda modernidade que ele precisa.

Se por um lado Rimbaud diz: "Il faut etre absolument moderne", posteriormente Lorca dirá:

"Pintor, não te ocupes
em ser moderno.
É a única coisa que,
infelizmente,
não importa o que fizeres,
não poderás evitar de ser.

Eu canto teu desejo
de eterno limite."

É necessário que o artista conheça seu limite. Somente atitude não basta para arte. Os acontecimentos passam, a arte fica. O artista deve sim reconhecer sua loucura, para que somente assim ele possa controlar. A loucura não está em bigodes, roupas estranhas e um dente a menos. A loucura pouco produtiva se esconde na camisa de força do cotidiano. Dali não tem nada de louco ou esquizofrênico. Rimbaud ficou louco quando abandonou a arte. Como diria Bukowski no Amor é um cão dos diabos:

" que eles querem

Vallejo escrevendo sobre
solidão enquanto morria de
fome;
a orelha de Van Gogh rejeitada por uma
puta;
Rimbaud correndo para a África
em busca de ouro e encontrando
um caso incurável de sífilis;
Beethoven ficou surdo;
Pound foi arrastado pelas ruas
numa gaiola;
Chatterton tomou veneno para rato;
o cérebro de Hemingway pingando dentro
do suco de laranja;
Pascal cortando os pulsos na banheira;
Artaud trancado com os loucos;
Dostoiéviski de pé contra um muro;
Crane pulando na hélice de um barco;
Lorca baleado na estrada pelo exército
espanhol;
Berryman pulando de uma ponte;
Burroughs atirando na mulher;
Mailer esfaqueando a sua;
- é isso o que eles querem:
o danado dum show
uma placa luminosa
no meio do inferno.
é isso que eles querem,
aquele bando de
estúpidos
inarticulados
tranquilos
seguros
admiradores de
carnavais."

Deus está morto, mas a arte ainda consegue ser redentora.